Esta ocorreu-me ao olhar para uma estrela de 5 pontas, neste Natal.
Há uns bons anos, partindo de "uma estrela regular de 5 pontas" (não vamos discutir a precisão matemática desta designação, ok?), ocorreu-me uma forma de deduzir o cosseno de $36^{\circ}$.
Está em https://cpaulof2.blogspot.com/2013/06/o-numero-de-ouro-parte-3-o-pentagrama-e.html.
Nesse post, eu mostrei que \[\cos 36^{\circ}=\frac{\phi}{2}\] onde $\phi$ é o número de ouro
\[\phi=\frac{1+\sqrt{5}}{2}\]
Ora, uma fórmula que acabo por utilizar sempre que me aparecem alunos a pedir explicações de cadeiras que envolvem cálculo integral é
\[{\sen}^{2} \alpha=\frac{1-\cos (2\alpha)}{2}\]
(um dia destes anexo uns formulários de trigonometria e de séries ao blog...)
Com umas pequenas manipulações algébricas escreve-se
\begin{eqnarray*}
{{\sen}^{2} 18^{\circ}}&=&{\frac{1-\cos 36^{\circ}}{2}}\\
{}&=&{\frac{1-\displaystyle\frac{1+\sqrt{5}}{4}}{2}}\\
{}&=&{\frac{4-1-\sqrt{5}}{8}}\\
{}&=&{\frac{3-\sqrt{5}}{8}}
\end{eqnarray*}
Vou tentar transformar $\displaystyle\frac{3-\sqrt{5}}{8}$ no quadrado de um número positivo.
\begin{eqnarray*}
{\frac{3-\sqrt{5}}{8}}&=&{\frac{6-2\sqrt{5}}{16}}\\
{}&=&{\frac{5-2\sqrt{5}+1}{16}}\\
{}&=&{\frac{\sqrt{5}^2-2\sqrt{5}+1^2}{4^4}}\\
{}&=&{\left(\frac{\sqrt{5}-1}{4}\right)^2}
\end{eqnarray*}
Conclusão:
\[\sen 18^{\circ}=\frac{\sqrt{5}-1}{4}\]
$\blacksquare$
Feliz Natal
Podem ver uma demonstração alternativa, e que se pode apresentar a alunos do ensino secundário em:
https://www.youtube.com/watch?v=_00oskWLtII.
Hoje em dia encontra-se de tudo no youtube... mas eu pertenço à velha escola: Prefiro pensar e fazer eu...
Curiosidade diabólica(26/12/2019)
\begin{eqnarray*}
{\sen 666^{\circ}}&=&{\sen 306^{\circ}}\\
{}&=&{\sen -54^{\circ}}\\
{}&=&{-\sen 54^{\circ}}\\
{}&=&{-\cos 36 ^{\circ}}\\
{}&=&{-\frac{\phi}{2}}
\end{eqnarray*}
Em explicações, às vezes aparecem-nos coisas que desconhecíamos, ou que não tínhamos notado até esse momento.
Há uns anos numa lista de exercícios de Probabilidades e Estatística de um aluno da professora Sandra Mendonça (Universidade da Madeira), apareceu, (como curiosidade) a igualdade
\[\gamma=-\Gamma'(1)\]
Onde $\gamma$ é a constante de Euler-Mascheroni.
Fui à minha calculadora, e observei (numericamente) o resultado.
O que se passava é que a definição que eu conhecia de $\gamma$, não era aquela, portanto devia ser possível deduzir a partir da definição que eu tinha, ou de alguma das fórmulas que eu conhecia.
Fui à Wikipedia. Reencontrei a propriedade, mas nada de prova...
Pensei um pouco e consegui chegar à demonstração que deixo aqui hoje.
Vou começar por partilhar convosco um pequeno e antigo pdf meu, de 12 páginas sobre a função Gama (de Euler).
Como função auxiliar vou introduzir a função digama, $\psi$ , que é a derivada logarítmica da Gama, isto é
\[
\psi (x): = \left( {\ln \Gamma \left( x \right)} \right)^\prime = \frac{\Gamma '\left( x \right)}{\Gamma \left( x \right)}
\]
Da fórmula produto de Weierstrass, (aplicando logaritmos a ambos os membros) é imediato que
\[
- \ln \Gamma \left( x \right) = \ln x +\gamma x + \sum\limits_{k = 1}^{ + \infty } {\left[ {\ln \left( {\frac{{k + x}}{k}} \right) - \frac{x}{k}} \right]}
\]
Está na moda a (errada) filosofia de que as demonstrações só interessam aos matemáticos. Sem provas pregam-se dogmas, e não ciência. Biologia, Física, Geologia, Matemática, Química são ciências e não religiões. Uma formação científica decente deve ser capaz de dar demonstrações aos alunos, sem se tornar maçadora e aborrecida.
Hoje vou partir da definição de "movimento rectilíneo uniformemente variado" e deduzir as equações da velocidade e das posições, sem recorrer explícitamente ao cálculo integral.
[Esta prova ocorreu-me ontem num esclarecimento de dúvidas de Física de 11º... porque a vi quando eu estava no meu ensino secundário]
movimento rectilíneo uniformemente variado (m.r.u.v.) é um movimento rectilíneo em que a aceleração é constante e tem um valor $a$.
Se é constante, a aceleração média é também constante e igual ao mesmo valor $a$, ou seja
\[\frac{\Delta v}{\Delta t} =a \]
Isso significa que se o objecto inicia o movimento no instante $t=0$ com velocidade $v_0$, noutro instante $t$ terá velocidade $v$, cuja fórmula pode ser facilmente deduzida:
\begin{eqnarray*}
{\frac{\Delta v}{\Delta t} =a}{\Leftrightarrow}{\frac{v-v_0}{t-0} =a}\\
{}{\Leftrightarrow}{v-v_0=at}\\
{}{\Leftrightarrow}{v=v_0+at}
\end{eqnarray*}
Portanto a equação das velocidades é
\[v=v_0+at\]
Num gráfico velocidade-tempo, esta velocidade é uma função afim, ou seja, tem o gráfico de uma recta.
A área entre o gráfico da velocidade e o eixo dos "$t$" dá-nos a variação de posição $\Delta x$ (porquê?).
E assim, para deduzirmos a equação do movimento basta recordar e aplicar a fórmula da área do trapézio:
\[A= \frac{B+b}{2}\times h\]
Onde $B$ e $b$ são as bases e $h$ a altura do trapézio.
Portanto
\[\Delta x=\frac{(v_0+at)+v_0}{2}\times t=v_0t+\frac{1}{2}at^2\]
Assumindo que no instante $t$ o objecto está na posição $x$ e no instante $t=0$ estava na posição $x_0$, temos
\[x-x_0=v_0t+\frac{1}{2}at^2\]
Ou seja
\[x=x_0+v_0t+\frac{1}{2}at^2\]
Que é a equação do movimento do objecto.
Ontem à noite, estava eu sentado, num café, a resolver alguns exercícios de Probabilidades e Estatística. Precisei de umas fórmulas para a binomial negativa. Tinha as fórmulas nos meus apontamentos, mas não tinha a dedução. Já estava meio farto de cálculos "mecânicos".
Estava sem bateria no telemóvel, portanto, estava sem acesso à Internet.
Isto foi o que me ocorreu (isto são só cálculos, mas parece que sou mais produtivo num café do que em casa ou no trabalho):
Sabe-se que se $0<|x|<1$ então
\[
\sum\limits_{n = 0}^\infty {x^n } = \frac{1}{{1 - x}}
\]
Derivando esta expressão termo a termo temos:
\[
\sum\limits_{n = 0}^\infty {nx^{n-1} } = \frac{1}{\left(1 - x\right)^2}
\]
Note-se que o primeiro termo da série é zero , portanto esta igualdade pode ser reescrita
\[
\sum\limits_{n = 1}^\infty {nx^{n-1} } = \frac{1}{\left(1 - x\right)^2}
\]
Voltando a derivar cada um dos membros
\[
\sum\limits_{n = 1}^\infty {n(n-1)x^{n-2} } = \frac{2}{\left(1 - x\right)^3}
\]
E mais uma vez
\[
\sum\limits_{n = 2}^\infty {n(n-1)x^{n-2} } = \frac{2}{\left(1 - x\right)^3}
\]
Continuando a derivar obtemos
\[
\color{red}\sum\limits_{n = k}^\infty {n(n-1)\cdots(n-k+1)x^{n-k} } = \frac{k!}{\left(1 - x\right)^{k+1}}
\]
(Fórmula que pode ser confirmada pelo método de indução)
Onde $n(n-1)\cdots(n-k+1)={}^{n}A_k$ é a conhecida fórmula para arranjos de $n$ $k$ a $k$
Dividindo ambas as expressões por $k!$ obtém-se
\[
\color{blue}\sum\limits_{n = k}^\infty {\left(\begin{array}{l}
{n}\\
{k}
\end{array}
\right)x^{n-k} } = \frac{1}{\left(1 - x\right)^{k+1}}
\]
Fazendo as mudanças de variáveis $N=n+1$ e $K=k+1$, esta igualdade converte-se em
\[
\color{green}\sum\limits_{N = K}^\infty {\left(\begin{array}{l}
{N-1}\\
{K-1}
\end{array}
\right)x^{N-K} } = \frac{1}{\left(1 - x\right)^{K}}
\]
Eu nunca tinha feito isto antes. Em caso de gralhas ou erros, eu vou acabar por corrigir, mas podem contactar-me.
Obviamente, existem outras formas de fazer algumas destas coisas... eu sei onde pode ver algumas. Por exemplo, posso sugerir o capítulo 4 da primeira edição do livro Introdução à Probabilidade e
à Estatística , de Dinis Pestana e Sílvio Velosa — estou a sugerir a primeira edição porque no dia em que escrevo isto é a que está à minha frente!
O operador Laplaciano apareceu-me muitas vezes em problemas com equações diferenciais com derivadas parciais, em problemas de electromagnetismo, e mais recentemente em problemas de mecânica quântica. Muitas vezes é necessário fazer uma mudança de variáveis, para coordenadas polares, esféricas, cilíndricas...
Normalmente, as fórmulas são dadas, sem qualquer dedução. Não porque a dedução em si seja difícil, mas porque os cálculos em si podem ser longos e não trazem nada de novo. O problema deste ponto de vista é que há quem nunca tenha visto nem feito uma dedução! É um mero exercício de cálculo e de aplicação de principalmente da regra da derivação do produto e da regra da cadeia, para quem quiser fazer.
...E que proponho que se faça! Clicando nos botões podem ver a minha solução e a minha resolução. Sugiro que tente fazê-la primeiro!
O Laplaciano em coordenadas polares
Seja $f:D \subseteq \R^2 \to \R$ uma função real de variável vectorial, ou, como vai ser designação comum neste blog, um campo escalar.
Suponhamos que a função é de classe $C^2$ em $D$.
O Laplaciano de $f$ é a divergência do gradiente de $f$.
\[
\nabla ^2 f = \nabla \cdot \nabla f = \dfrc{{\partial ^2 f}}{{\partial x{}^2}} + \dfrc{{\partial ^2 f}}{{\partial y{}^2}}
\]
Considere-se a nova função que se obtém fazendo a mudança de variáveis
\[
\left\{ {\begin{array}{l}
{x = r\cos \theta } \\
{y = r\sen \theta }
\end{array}} \right.
\]
para $r>0$ e $\theta\in [0,2\pi[ $ por forma a que, a nova definição faça sentido.
Por abuso de linguagem, continuemos a designar a nova função por $f$. Determine uma nova fórmula para $\nabla ^2 f$ em função das novas variáveis $r$ e $\theta$.
\[\nabla ^2 f=\dfrc{{\partial ^2 f}}{{\partial r^2 }} + \dfrc{1}{r}\dfrc{\partial f}{\partial r} + \dfrc{1}{{r^2 }}\dfrc{{\partial ^2 f}}{{\partial \theta ^2 }}\]
(Carlos Paulo A. de Freitas; 19/07/2019)
Seja $f:D \subseteq \R^3 \to \R$ um campo escalar.
Suponhamos que a função é de classe $C^2$ em $D$.
O Laplaciano de $f$ é a divergência do gradiente de $f$.
\[
\nabla ^2 f = \nabla \cdot \nabla f = \dfrc{\partial ^2 f}{\partial x^2} + \dfrc{\partial ^2 f}{\partial y^2}+ \dfrc{\partial ^2 f}{\partial z^2}
\]
Considere-se a nova função que se obtém fazendo a mudança de variáveis
\[
\left\{ {\begin{array}{l}
{x = r\sen \theta \cos \phi} \\
{y = r\sen \theta \sen \phi} \\
{z = r\cos \theta}
\end{array}} \right.
\]
para $r>0$, $\theta\in [0,\pi[ $ e $\phi\in [0,2\pi[ $ por forma a que, a nova definição faça sentido.
Por abuso de linguagem, continuemos a designar a nova função por $f$.
Mostre que
\[
\nabla ^2 f = \frac{1}{r^2}\left[\frac{\partial}{\partial r} \left( {r^2}\dfrc{\partial f}{\partial r} \right) + \frac{1}{ \sen \theta }\frac{\partial }{{\partial \theta }}\left( {\sen \theta \frac{{\partial f}}{{\partial \theta }}} \right) + \frac{1}{{ \sen ^2 \theta }}\frac{{\partial ^2 f}}{{\partial \phi ^2 }}\right]
\]
Nota: Um dia deixo a minha dedução, análoga à dedução da fórmula em coordenadas polares.
Há uns meses chegou-me um explicando com o seguinte problema.
Seja $k\in \R \backslash \{0\} $. Calcule um valor de $k$ de modo que:
\[
\int\limits_k^\pi {\frac{1}{{\left( {2 + \sin ^2 \left( {2x} \right)} \right)\cos ^{ - 1} \left( {2x} \right)}}dx = - \frac{{\sqrt 2 }}{2}\pi }
\]
Ao resolver a equação percebi que a equação era impossível!
Abaixo (botão) deixo a minha resolução feita nesse dia.
\begin{eqnarray*}
{\int\limits_k^\pi {\frac{1}{{\left( {2 + \sin ^2 \left( {2x} \right)} \right)\cos ^{ - 1} \left( {2x} \right)}}dx}}& {=} &{ - \frac{{\sqrt 2 }}{2}\pi }\\
{\Leftrightarrow \int\limits_k^\pi {\frac{{\cos \left( {2x} \right)}}{{2 + \sin ^2 \left( {2x} \right)}}dx}}&{ = }&{ - \frac{{\sqrt 2 }}{2}\pi }\\
{\Leftrightarrow \frac{1}{2}\int\limits_k^\pi {\frac{{\cos \left( {2x} \right)}}{{1 + \left( {\displaystyle\frac{{\sin \left( {2x} \right)}}{{\sqrt 2 }}} \right)^2 }}dx}} &{=}& { - \frac{{\sqrt 2 }}{2}\pi }\\
{\Leftrightarrow \frac{1}{2}\frac{{\sqrt 2 }}{2}\int\limits_k^\pi {\displaystyle\frac{{\displaystyle\frac{2}{{\sqrt 2 }}\cos \left( {2x} \right)}}{{1 + \left( {\displaystyle\frac{{\sin \left( {2x} \right)}}{{\sqrt 2 }}} \right)^2 }}dx}}&{ = }&{ - \frac{{\sqrt 2 }}{2}\pi } \\
{\Leftrightarrow \int\limits_k^\pi {\frac{{\displaystyle\frac{2}{{\sqrt 2 }}\cos \left( {2x} \right)}}{{1 + \left( {\displaystyle\frac{{\sin \left( {2x} \right)}}{{\sqrt 2 }}} \right)^2 }}dx}}&{ = }& { - 2\pi } \\
{\Leftrightarrow - \arctg\left( {\frac{{\sin \left( {2k} \right)}}{{\sqrt 2 }}} \right)}&{ = }&{ - 2\pi } \\
{\Leftrightarrow \arctg\left( {\frac{{\sin \left( {2k} \right)}}{{\sqrt 2 }}} \right)}&{ = }&{ 2\pi } \\
\end{eqnarray*}
Uma vez que o contradomínio da função arcotangente é $\left] { -\displaystyle \frac{\pi }{2},\displaystyle\frac{\pi }{2}} \right[$, a equação obtida é impossível.
Quero que compreendam que mesmo deslocando o contradomínio do arcotangente por um múltiplo inteiro de $\pi$, a equação original continua a ser impossível, visto que essa constante "desapareceria" no decorrer dos cálculos (nomeadamente depois de aplicação da regra de Barrow).
Escrever
\[{\frac{{\sin \left( {2k} \right)}}{{\sqrt 2 }}}=\tg (2\pi)\]
É um erro gravíssimo!!! (e que demonstra sério e grave desconhecimento do que se anda a fazer)!
Mas, para que não fiquem dúvidas na cabeça mais teimosa, vou provar a impossibilidade daquela equação de outra forma.
Considere-se a função:
\[
F(k) = \int\limits_k^\pi {\frac{1}{{\left( {2 + \sin ^2 \left( {2x} \right)} \right)\cos ^{ - 1} \left( {2x} \right)}}dx} = - \frac{{\sqrt 2 }}{4}\arctg\left( {\frac{{\sin \left( {2k} \right)}}{{\sqrt 2 }}} \right)
\]
Ora, como
\[- 1 \le \sin \left( {2k} \right) \le 1 \]
então
\[\frac{{ - 1}}{{\sqrt 2 }} \le \frac{{\sin \left( {2k} \right)}}{{\sqrt 2 }} \le \frac{1}{{\sqrt 2 }}\]
Então isto implica que
\[{{ - 1}} \leq \frac{{\sin \left( {2k} \right)}}{{\sqrt 2 }} \leq {1}\]
\[\Leftrightarrow - \frac{\pi }{4} \le \arctg\left( {\frac{{\sin \left( {2k} \right)}}{{\sqrt 2 }}} \right) \le \frac{\pi }{4}\]
\[ \Leftrightarrow - \frac{{\pi \sqrt 2 }}{{16}} \le - \frac{{\sqrt 2 }}{4}\arctg\left( {\frac{{\sin \left( {2k} \right)}}{{\sqrt 2 }}} \right) \le \frac{{\pi \sqrt 2 }}{{16}}\]
\[ \Leftrightarrow - \frac{{\pi \sqrt 2 }}{{16}} \le F(k) \le \frac{{\pi \sqrt 2 }}{{16}}\]
Esta última condição prova que $-\displaystyle\frac{{\sqrt 2 }}{2}\pi$ está fora do contradomínio de $F$, portanto a equação original é impossível.
Numa última nota:
Não percebi porque se exige no enunciado que $k\neq 0$. Faz-me suspeitar que há algo de errado com o enunciado.
Eu 'verifiquei' numericamente as minhas afirmações antes de me dar ao trabalho de escrever isto... podia ter erros nos cálculos.
Como sempre, se encontrarem gralhas ou incorrecções, podem enviar-me para cpaulof at gmail dot com
Actualizações:
03/07/2019: $\cos^{-1}$ deve ser interpretado como a função secante, e não como a função arco-cosseno, graças aos valores dos limites de integração.
03/07/2019: em vez de $k\in\R\backslash \{0\}$ penso que $k$ deve pertencer a um subconjunto de $\R\backslash \left\{x=\displaystyle\frac{\pi}{4}+\frac{n\pi}{2}, n\in \Z\right\}$, mas não sei. O enunciado não é meu.
Recentemente, depois de ver o filme "Avengers: Endgame", onde a solução de Tony Stark para um problema físico (não vou dar mais spoilers do que o necessário, se quiserem, vão lá ver o filme) passava por uma faixa de Möbius, andei a fazer umas experiências com a faixa de Möbius.
Não me apeteceu utilizar a Wikipedia... apeteceu-me usar o cérebro.
(Algo que até faço quando uso uma calculadora...quem diria, não é?)
Passo 0:
O que é uma faixa/fita de Möbius?
De forma muito simplista, neste post, a minha faixa de Möbius vai ser a superfície descrita por um segmento de recta que percorre uma circunferência enquanto roda meia volta sobre o seu centro. Vejam a animação seguinte que percebem melhor,
Se calhar fica melhor se eu mostrar a superfície a ser desenhada:
Portanto, é boa ideia começar por parametrizar um segmento de recta que dá meia volta!
Passo 1: No plano $xOy$ parametrizar um segmento de recta, centrado na origem, que dá meia volta, em torno da origem.
Dados dois pontos distintos do plano ou do espaço, $A$ e $B$, o segmento $[BA]$ pode ser parametrizado por .
\[X=tA+(1-t)B\] com $t \in [0,1]$
Portanto, se, para um ângulo qualquer de amplitude $\alpha$ considerarmos os pontos da circunferência trigonométrica
\[A=(\cos \alpha,\sen \alpha) \] e \[B=(\cos (\alpha + \pi), \sen (\alpha + \pi)) \]. que são simétricos relativamente à origem $O ( 0,0 )$
O segmento é o conjunto dos pontos
\begin{eqnarray*}
{(x,y)}&=&{t\left(\cos \alpha,\sen \alpha)+(1-t)(\cos (\alpha + \pi), \sen (\alpha + \pi)\right)}\\
{}&=&{\left(t\cos \alpha +(1-t)(\cos (\alpha + \pi),(t\sen \alpha +(1-t)(\sen (\alpha + \pi)\right)}
\end{eqnarray*}
Para termos a "meia volta" podemos deixar o ângulo $\alpha$ variar entre $0$ e $\pi$.
Mas como a ideia é que o segmento dê meia volta enquanto percorre uma circunferência, então vou substituir o $\alpha$ por um $\displaystyle \frac{\theta}{2}$ com $\theta$ a variar entre $0$ e $2\pi$
Passo 2: Fazer este segmento girar enquanto percorre uma circunferência de raio $R$
No espaço tridimensional $\R^3$ uma circunferência de raio $R$ centrada na origem e contida no plano $z=0$ pode ser parametrizada por
\[ (x,y,z)=(R\cos \theta, R \sen \theta, 0 ) \]
com \[0\leq\theta <2\pi\]
Para obter o efeito desejado, basta ver que a "semivolta" é dada apenas nas componentes $x$ e $z$, portanto, a equação do percurso do segmento de recta tem de ser:
\begin{eqnarray*}
{ (x,y,z)}&=&{(R\cos \theta, R \sen \theta, 0 ) + \left(t\cos \left(\frac{\theta}{2}\right)+ (1-t)\cos \left(\frac{\theta}{2} + \pi\right),0,t\sen \left(\frac{\theta}{2}\right) + (1-t)\sen \left(\frac{\theta}{2} + \pi\right)\right)}\\
{}&=&{\left(R\cos \theta +t\cos \left(\frac{\theta}{2}\right)+ (1-t)\cos \left(\frac{\theta}{2} + \pi\right), R \sen \theta, t\sen \left(\frac{\theta}{2}\right)+ (1-t)\sen \left(\frac{\theta}{2} + \pi\right) \right)}
\end{eqnarray*} Passo 3: conclusão.
Então uma parametrização para esta faixa de Möbius é
\[ (x,y,z)=\left(R\cos \theta +t\cos \left(\frac{\theta}{2}\right)+ (1-t)\cos
\left(\frac{\theta}{2} + \pi\right), R \sen \theta, t\sen
\left(\frac{\theta}{2}\right)+ (1-t)\sen \left(\frac{\theta}{2} + \pi\right) \right)\] Com $0\leq t\leq 1$ e $0\leq \theta < 2\pi $.
A animação que se segue foi gerada com estas equações no software Geogebra
Percebeu a dedução? Se sim, qual o comprimento do segmento de recta que está a girar? Como ficaria a parametrização para um
segmento de comprimento $L$, centrado na origem?
As funções trigonométricas dos ângulos $\left(\displaystyle\frac{\theta}{2} + \pi\right)$ não foram simplificadas de propósito. Se assim o desejar, simplifique a expressão obtida o melhor que conseguir.
Recentemente encontrei um problema num dos meus programas de calculadora dos anos 90 a correr numa máquina actual. Na verdade o "problema" deve-se a ter sido escrito numa máquina diferente, e ao fabricante (a CASIO) ter feito algumas modificações nas calculadoras.
Problema facilmente resolúvel. O programa chama-se "números" e uma vez introduzido um número natural dá ao utilizador a decomposição em factores primos, a função $\varphi$ de Euler, o número de divisores, a soma dos divisores e o produto dos divisores, e como bónus até podia mostrar todos os divisores do número.
O programa foi escrito para me servir de apoio numa disciplina de Teoria dos Números, visto que na altura eu estava com um sério problema de saúde e tinha sérios problemas em concentrar-me (aliás, foi nesse ano em que pela primeira vez tive de desistir numa frequência e deixar para exame).
A função $\varphi$ de Euler, dá, para cada natural $n$ o número de números naturais entre 1 e $n-1$ (inclusive) que é coprimo com $n$, ou, por outras palavras, \[ \varphi(n)= \#\left\{m\in \N_1:m<n \land \left(m \text{ e } n \text{ são primos entre si }\right)\right\}\]
Abaixo vou propor um exercício sem indicar as fórmulas para o resolver, e que é rapidamente resolvido por esse programa de calculadora Exercício:
Considere o número $n=25401600$. Para este número determine:
Decomposição de $n$ em factores primos
número de divisores de $n$
soma dos divisores de $n$
produto dos divisores de $n$
$\varphi(n)$
Os divisores de $n$
Decomposição de $25401600$ em factores primos: $25401600=2^8\times3^4\times5^2\times7^2$
$25401600$
$2$
$12700800$
$2$
$6350400$
$2$
$3175200$
$2$
$1587600$
$2$
$793800$
$2$
$396900$
$2$
$198450$
$2$
$99225$
$3$
$33075$
$3$
$11025$
$3$
$3675$
$3$
$1225$
$5$
$245$
$5$
$49$
$7$
$7$
$7$
$1$
O número de divisores de $25401600$ é $405$
número de divisores de $25401600$ = $\tau(25401600)=(8+1)\times(4+1)\times(2+1)\times(2+1)=405$
soma dos divisores de $25401600$: $109255377$
soma dos divisores de $25401600$ = $\displaystyle\frac{2^{8+1}-1}{2-1}\times\displaystyle\frac{3^{4+1}-1}{3-1}\times\displaystyle\frac{5^{2+1}-1}{5-1}\times\displaystyle\frac{7^{2+1}-1}{7-1}=109255377$
produto dos divisores de $25401600 \approx 3,050473527\times 10^{1499}$:
Recentemente, uma explicanda trouxe-me o problema:
\[
\left\{ {\begin{array}{l}
{u_1 = 3} \\
{u_{n + 1} = u_n + 2n, \text{ se }n > 1}
\end{array}} \right.
\]
Qual o valor de $\displaystyle\sum\limits_{n = 1}^{100} {u_n}$?
Respondi imediatamente que esse problema estava fora do programa da disciplina dela, mas que podia resolvê-lo na boa, e sem calculadora!
Como estava fora de questão recorrer aos meus conhecimentos de equações com diferenças, tive de ser criativo.
\begin{eqnarray*}
{u_1}&{=}&{3}\\
{u_2}&{=}&{3+2}\\
{u_3}&{=}&{3+2+4}\\
{u_4}&{=}&{3+2+4+6}\\
{u_5}&{=}&{3+2+4+6+8}\\
{u_6}&{=}&{3+2+4+6+8+10}\\
{...}&{...}&{...}\\
{u_n}&{=}&{3+2\cdot\frac{(n-1)n}{2}=3+(n-1)n}
\end{eqnarray*}
Justifiquei-lhe o último passo com a fórmula da soma dos primeiros $n$ termos de uma progressão aritmética.
Para o passo sequinte, o cálculo do somatório, tive de ser um pouco mais criativo.
Comecei por escrever
\[\sum\limits_{n = 1}^{100} {u_n}=\sum\limits_{n = 1}^{100} {\left(3+(n-1)n\right)}=300+\sum\limits_{n = 1}^{100} {n^2}-5050\]
Justifiquei convenientemente os números $300$ e o $5050$, contando a famosa história de Gauss.
Mas para o somatório dos quadrados, não me lembrava da fórmula de cor, embora me apareça regularmente em exercícios de indução. Sabia deduzi-la com equações com diferenças, coisa que eu tinha de evitar porque a explicanda desconhecia.
Mas ao olhar para o papel quadriculado, ocorreu-me a fórmula:
\[\sum\limits_{n = 1}^{100} {n^2}=100\times1+99\times 3+98\times 5 + ... + 1 \times (200-1) = \sum\limits_{n = 1}^{100} {(101-n)(2n-1)}\]
Consegue percebê-la sem eu partilhar um desenho?
E agora, com este desenho?
Se fizermos $S=\displaystyle\sum\limits_{n = 1}^{100} {n^2}$, a fórmula anterior consegue reescrever-se na forma
\[S=-2S+\sum\limits_{n = 1}^{100} {203n}-101\times 100 \]
Que nos leva a $3S=1015050$ (número curioso) e portanto $S=338350$.
Logo
\[\sum\limits_{n = 1}^{100} {u_n}=300+338350-5050=333600\]
Ao que ela respondeu-me: "Percebi, mas não deve ser para resolver assim."
PS: Quando se foi embora, escrevi um programa na calculadora que confirmou a minha solução...